quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Entrevista de Fernando Grecco ao jornal Folha de Votorantim


Entrevista de Fernando Grecco, diretor administrativo da Associação Vuturaty Ambiental, concedida ao jornalista Valdinei Queiroz da Folha de Votorantim:


Folha:As sacolas de plástico surgiram no fim da década de 1950, sendo motivo de orgulho das redes de supermercados. 62 anos depois, o que era status para as donas de casa, agora é uma alternativa para educar a população a reciclar e pensar no meio ambiente. Pois bem. Queria que o senhor falasse da chegada e remoção das sacolas plásticas: qual sua opinião sobre este cenário?


FG: O acordo entre os varejistas referente às sacolas plásticas nos supermercados apresenta-se maquiada de uma ação ambientalista, quando na verdade se trata apenas de uma máscara que camufla interesses de natureza econômica. É evidente que a campanha com viés ambiental é bem atraente e tende a convencer a população por inércia. Mas, nesse caso, não podemos confundir ações ambientalmente corretas com interesse empresarial. Na verdade o único interesse da APAS (Associação Paulista dos Supermercados) é poupar os grandes supermercados na aquisição dessas sacolas, pois a medida atinge 150 cidades do Estado, justamente onde se concentra 80% da população paulista. Segundo informações da própria APAS, 2,5 bilhões de sacolas são consumidas mensalmente só na capital paulista, dados que nos remetem a uma economia de R$ 500 milhões de reais às grandes redes de supermercados. Dessa forma, conclui-se sem muitas dificuldades que se trata de uma manobra com o propósito único de favorecer economicamente os maiores varejistas do Estado. Para eles, a questão ambiental serve apenas para fins publicitários.
Outrossim, não é o caso de inibir o uso das sacolas, mas sim promover seu uso racional. Segundo o Datafolha, 88% da população reutilizam as sacolas, 6% encaminham para processos de reciclagem e somente 7% descartam esse material indevidamente. Acreditamos que uma campanha de educação ambiental nesse sentido é mais profícua se comparada a esses acordos que atendem aos interesses de um só lado.


Folha: Os consumidores estão fazendo vários questionamentos, tais como: “Onde vamos colocar os restos de alimentos?”; "Como vou colocar os produtos que comprei?"; entre outras expressões. Talvez algum especialista diga: é simples. Compre uma sacola preta e coloque todos os restos de alimento. Agora pensando em uma família extremamente pobre. Como faz? É uma questão que deve ser discutida. Ao traçar esta reflexão, o que o senhor tem a indagar?


FG: Tratando-se de uma medida unilateral imposta à sociedade pelos varejistas, não existe a preocupação com a população de baixa renda. O sistema econômico vigente, baseado no aumento incessante do lucro, não se pauta por ações humanitárias. Quaisquer que sejam os princípios norteadores das práticas humanistas em vigor, isso em nada influi nas decisões, que se pautam exclusivamente pela ética do lucro. Como já apregoava Marx, “quando as evoluções se efetuam, não é porque obedecem a um ideal elevado de justiça, mas sim porque se ajustam a ordem econômica do momento”.


Folha: Os mercados estão vendendo sacolinha biodegradável por R$ 0,19. Só que há um problema: na sacola vem a marca do estabelecimento comercial. Estamos pagando e ainda fazendo propaganda de graça do mercado. E segundo especialistas, essa sacola não resolve o problema porque não há compostagem, capaz de degradar lixo orgânico. O senhor acha que é apenas essa solução, a de comprar a sacola biodegradável?


FG: É evidente que o uso de sacola biodegradável é uma ação simpática aos nossos olhos, uma vez que são confeccionadas com polímeros naturais ao invés de matérias primas derivadas do petróleo. No entanto, não se pode aceitar a publicidade que estão nos vendendo, de que as sacolas plásticas são as grandes vilãs do meio ambiente. Há infinitos outros fatores que causam impactos ambientais bem mais significativos, no entanto, isso não é notícia, provavelmente porque envolve o nome de grandes empresas brasileiras e multinacionais. Da mesma forma que os supermercados ofereciam as sacolas “gratuitamente”, poderia disponibilizar àquelas biodegradáveis sem custo aos clientes, não é? Por que não o fazem, já que têm patrocinado uma campanha transmitindo a ideia de que estão preocupados com a questão ambiental?


Folha: Outra reflexão dos consumidores é em relação de outros plásticos estarem nas prateleiras dos mercados e que foram removidos. Esse plástico que está nas bolsas de soro, nos automóveis, nos alimentos é menos prejudicial que a sacola plástica?


FG: Todo produto industrializado, independente de sua natureza química, gera impacto ambiental. O que precisamos compreender é que o nosso modelo de “desenvolvimento” é por si só suicida do ponto de vista da preservação e conservação do meio ambiente. Quando se fala em desenvolvimento sustentável, por exemplo, trata-se de um contrassenso sem tamanho, pois não existe compatibilidade entre desenvolvimento aos moldes capitalistas e sustentabilidade. O que podemos imaginar são medidas que reduzam os impactos, mas nunca demonizar um ou outro produto como sendo responsável por todos os problemas ambientais do planeta. Uma revisão em nosso comportamento, reduzindo o consumo desnecessário, seria bem mais eficaz do que a proibição de sacolas em supermercados.